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Viagra e a transmissão de ISTs na terceira idade

No início dos anos de 1990 existia uma pesquisa em desenvolvimento com o objetivo de sintetizar um novo fármaco para o controle da hipertensão, desordem esta relacionada a alterações na pressão sanguínea.

Chamado tecnicamente de citrato de sildenafil, ou simplesmente sildenafil, este medicamente foi sintetizado por farmacêuticos e químicos que trabalham para grande farmacêutica Pfizer, na Inglaterra, sendo testado e analisado em pessoas debilitadas pela hipertensão e angina (um sintoma relacionado à isquemia miocárdica, tipo de doença que prejudica o funcionamento das artérias coronarianas).

Com o desenvolvimento dos primeiros ensaios clínicos realizados nas populações alvos, verificou-se que para o objetivo inicial que o sildenafil foi inventado – combate hipertensão e angina – apresentava um fraco efeito, e não os resultados esperados pelos cientistas.

Entretanto, algo que poderia ter dado errado acabou dando certo (como muitas coisas em nossas vidas): apesar de os cientistas não verificarem o que eles queriam ver, acabaram vendo algo que não esperavam ver: o pênis dos pacientes masculinos ficava ereto.

Bingo! Uma descoberta científica que resultou no tratamento para disfunção erétil, até então o pesadelo de muitos homens que só contavam com produtos naturais (desde garrafadas “mágicas” com cipós e ervas da Amazônia, até outros produtos afrodisíacos de origem animal).

Vendo as possibilidades, a Pfizer decidiu usar o sildenafil como um novo fármaco para tratar disfunção erétil, patenteando a droga no ano de 1996, desenvolvendo os demais testes protocolares em dois anos (sendo aprovada pela Food and Drugs Administration em Março de 1998), e disponibilizando para vendas em todas as farmácias americanas e do mundo.

Com um nome mais comercial e mais acessível – Viagra - a droga se mostrou um sucesso instantâneo, alcançando vendas superiores a bilhões de dólares a cada ano que passa.

Esta nova droga trouxe novas possibilidades para muitos aqueles que perdiam a virilidade seja por diferentes motivos: velhice, doenças (adquirida ou hereditária) ou ainda apenas questões psicológicas.

Entretanto, se o problema da disfunção erétil estava sendo vencido, com isso trazendo alegria e satisfação sexual para milhões de pessoas, um feedback que muitos não esperavam (ou sim) acabou acontecendo.

Sabendo que a população da terceira idade é um dos grandes consumidores de remédios de disfunção erétil, foi observado um fenômeno desconhecido até então.

Muitos médicos e profissionais da saúde que estudavam a epidemiologia de doenças transmitidas pelo sexo desviaram a sua atenção para os elevados números de IST’s (infecções sexualmente transmissíveis) em senhores e senhoras de idade.

Primeiramente, a associação não foi identificada: o normal é que IST’s se concentrem em populações mais jovens, mais sexualmente ativas, com maiores números de parceiros, e outras características envolvidas com a idade.

O que será que estava acontecendo então para aparecerem tantos indivíduos da terceira idade com HIV, sífilis, gonorréia e tantas outras infecções e doenças de natureza sexual.

Claro que após as pesquisas e as análises de associação, conforme a plausibilidade biológica das IST’s, junto com a temporalidade da descoberta e difusão do remédio pelo mundo, os pontos foram ligados: o Viagra estava sendo responsável pelo aumento da atividade sexual entre idosos, e estes sendo expostos aos patógenos e agentes infecciosos responsáveis pelas IST’s.

A questão não é apenas biológica, mas sócio-cultural também: enquanto muitos idosos em suas décadas de juventude não tinham o hábito de usar preservativo, com o surgimento do Viagra a frequência sexual aumentou, aumentando a exposição ao risco, atrelado a este comportamento de evitar o sexo seguro.

Muitos destes idosos quando jovens não passaram pelo horror que foi o HIV e AIDS na década de 1980: quando muito, eles eram expostos à sífilis e à gonorréia, então doenças bacterianas tratáveis com antibióticos.

Somando estes diferentes fatores, o resultado foi a explosão de casos de IST`s entre pessoas da terceira idade, trazendo assim novos desafios para os profissionais de saúde que estudam e combatem as doenças de natureza sexual.

Por causa disso, novas metodologias de prevenção foram criadas: para se aplicar efetivamente estas medidas, a linguagem da campanha deve corresponder com a do seu público alvo (não espere conscientizar um adolescente de 16 anos e um senhor de 65 anos utilizando mesma comunicação).

Atualmente, depois de mais de 20 anos do lançamento do Viagra, os números de IST’s envolvidos em indivíduos da terceira idade ainda é significativo, entretanto devido ao esforço dos profissionais, em especial os de geriatria e sexólogos para terceira idade, novas ferramentas de controle e combate a esta tendência tem sido produzidas e aplicadas para esta população vulnerável.