Quando se fala de educação sexual, tenta-se generalizar em um grande e uniforme grupo de pessoas, por assim deduzindo que todas estas estão, individualmente, expostas aos mesmos riscos, sem considerar as diferenças que existem entre elas, seja de natureza anatômica, seja ainda os fatores comportamentais e até socioeconômicos.
Fazer uma generalização desse tipo é um raciocínio extremamente incauto, principalmente do ponto de vista do sexo homossexual, já que se é verificado que homens que fazem sexo com homens e travestis tem riscos específicos para IST`s, assim como mulheres que fazem sexo com mulheres possuem outras tendências de riscos para as infecções sexualmente transmissíveis.
Claro, para deduzir algo do tipo, não é necessário anos de estudos e faculdades, nem de diploma de médico ou biólogo, afinal, ao pensar na situação pode-se deduzir intuitivamente: o ato sexual que envolve o órgão genital masculino - o famoso pênis - proporciona uma maior fricção (atrito) entre as mucosas, quando comparado com outras atividades sexuais que envolvam a língua, por exemplo.
Seja na vagina seja no ânus, a penetração peniana gera contínuos traumas (de pequeninas proporções) nas mucosas dos órgãos, estes podendo se intensificar conforme outros aspectos, como: a falta de lubrificação dos canais urogenitais (considerando ainda que o ânus é menos lubrificado que a vagina, por isso sexo entre homens é mais propício a micro-traumas proveniente da fricção sexual); a intensidade do ato sexual; a ausência da camisinha, logicamente (a segunda pele); se existe alguma ferida prévia, esta também podendo ser de natureza infecciosa sexual.
Por causa disso que, quando pensamos em vulnerabilidade para IST`s, devemos pensar nos sujeitos que estão envolvidos nas atividades sexuais, assim como os seus respectivos aspectos anatômicos, e o perfil comportamental sexual (quem é o ativo e quem é o passivo, por exemplo).
Essa diferença entre riscos para IST`s e a diferença anatômica entre os gêneros masculinos e femininos pode ser bem observada quando vemos a distribuição dos casos da doença sexualmente transmissível mais famosa - ou melhor: mais infame - que existe no planeta Terra, a infecção pelo HIV/AIDS.
Sabe-se que homens que fazem sexo com homens ainda compreendem um dos extratos populacionais mais vulneráveis à infecção sexual (com estatísticas atuais assustadoras, como por exemplo na cidade de São Paulo, no Brasil, onde um estudo* publicado em 2018 indicou que 1 em cada 4 homens que fazem sexo com homens entre 1 estavam infectados pelo HIV!). Todavia, ter-se verificado a feminilização da doença, principalmente a partir da década de 1990 (sendo que o aumento de mulheres infectadas pela via sexual segue também um padrão assustador: contaminação pelos próprios maridos e cônjuges).
Os dois exemplos acima consideraram pelo menos um indivíduo com pênis, podendo assim associar a infecção pelo HIV ao órgão genital, devido ao trauma causado pelo mesmo, também a carga do vírus que é encontrado no sêmen (considerando aqueles que não estão tomando os remédios antirretrovirais corretamente).
Por assim, repare que para os dois exemplos foram citados homens homossexuais e mulheres heterossexuais: e as mulheres homossexuais?
Realmente, pesquisas, inquéritos epidemiológicos e políticas sexuais nunca indicaram mulheres que fazem sexo com mulheres pertencendo a algum grupo vulnerável para a infecção pelo HIV/AIDS.
Mas por que será?
Mulheres que fazem sexo com mulheres não possuem o mesmo risco justamente pela diferença anatômica: elas não possuem pênis (desconsiderando transexuais não operadas), por assim, o risco de ocorrerem traumas nas mucosas por penetração peniana não existe (assim como o jato espermático, que pode trazer consigo partículas de agentes causadores de IST`s).
Nesse ponto convêm lembrar que secreções vaginais e sangue menstrual também pode ter carga considerável de HIV para a infecção, mas mesmo assim o risco é maior de um homem pegar de uma mulher do que uma mulher pegar de uma mulher.
Mas é claro que mulheres que fazem sexo com mulheres têm riscos para outras IST`s, principalmente as de mais fácil transmissão, que não necessitam de traumas sexuais ou mesmo elevada carga virótica (ou outro agente patogênico envolvidos nas IST`s como bactéria, protozoário, fungo, etc).
Essa situação pode-se balizar que mulheres que fazem sexo com mulheres têm os mesmos riscos de um hipotético homem que só pratica sexo oral, sem penetração com seu pênis.
Dentro do grupo dos vírus, o da Hepatite B pode sim ser transmitido pelo sexo lésbico, principalmente na prática do sexo oral-anal: considerando que este vírus precisa de menor carga na secreção do indivíduo para desencadear uma infecção, quando comparado ao HIV (por isso que o risco é maior de se contrair hepatite do que o vírus da AIDS, considerando ainda que não há registros científicos da transmissão do HIV só pelo sexo oral, apesar de existir o risco teórico).
Herpes e HPV também são dois vírus do grupo das IST`s que podem igualmente ser transmitidos apenas pelo sexo oral, ou seja: mulheres que fazem sexo com mulheres podem estar expostas a este patógenos.
Dentro do grupo das bactérias, a clamídia é bastante famosa dentro das IST`s, já que a sua proliferação pode ocorrer através de um simples beijo, por assim sendo bastante comum a sua infecção através do sexo oral.
Gonorreia também é uma doença causada por bactéria que é sempre lembrada por poder ser transmitida pelo sexo oral, assim mulheres lésbicas podem estar expostas a essa IST`s.
Sífilis é outra doença em que também existem indícios científicos de ter a sua transmissão apenas pelo sexo oral, ou seja: outra doença também que mulheres que fazem sexo com mulheres podem estar expostas.
Como exemplo de protozoário, temos o Trichomonas vaginalis, também com transmissão via ato sexual oral.
Lembrando que não apenas o contato direto entre mucosas é causa para que ocorra transmissão e infecção por estes agentes patogênicos: duas mulheres que compartilham um mesmo vibrador podem estar expostas a infecção; até pelos dedos, ou outro objeto erótico.
Por isso, sempre use proteção quando for fazer sexo, independente de qual gênero que você pertença, assim como o do seu parceiro sexual.
*Kerr et al. 2018 HIV prevalence among men who have sex with men in Brazil: results of the 2nd national survey using respondent-driven sampling. Medicine (Baltimore); 97(1 Suppl): S9-S15.